Muitas vezes, em meu consultório, após o paciente receber o diagnóstico de um câncer, é comum ouvir a pergunta: doutor, de onde isso veio? A medicina já tem um entendimento bastante razoável das causas do desenvolvimento do câncer. Em primeiro lugar, como apresentei no artigo anterior, sabemos que o câncer é uma doença genética, ou seja, o problema se inicia no material genético dentro das células que contêm as instruções de como elas devem funcionar. Essas instruções estão escritas em um alfabeto especial, em um “papel” muito especial também que são as moléculas denominadas ácidos ribonucleicos. No Brasil, são mais conhecidas por suas siglas em língua inglesa: DNA e RNA. Essas moléculas compõem o material genético que está dentro das células. As instruções nelas contidas comandam as atividades celulares: quando crescer e se multiplicar, quando produzir substâncias, quando parar de se multiplicar e quando morrer. Usualmente tudo funciona muito bem, entretanto, pode ser que alguma coisa aconteça a esse material genético, algum dano, alguma mutação (mudança “indesejada”) ou alguma alteração na sua leitura. Quando isso acontece, geralmente o problema é prontamente reparado pela célula. O nosso organismo é extremamente eficiente em reparar problemas no material genético. Eventualmente, os danos são irreparáveis, e então a célula é ordenada a se autodestruir, justamente para não causar maiores problemas. Entretanto, em algumas raras ocasiões, os mecanismos de defesa do organismo são incapazes de corrigir os erros ou destruir a célula anormal que, ocorrendo nas chamadas “células-tronco do câncer”, o câncer pode se desenvolver. Perceba que eu disse PODE, não quer dizer que VAI acontecer. Uma série de capacidades celulares são necessárias para que essa célula vire um câncer (já foram mapeadas mais de dez dessas capacidades). Ora, então o principal fator de risco para ter câncer é ESTAR VIVO! Quanto mais tempo vivemos, maiores as chances de que os mecanismos de conserto do organismo falhem e que a célula-tronco do câncer desenvolva as capacidades necessárias para virar câncer.
E o que pode levar a esses erros na célula-tronco do câncer? Bem, temos três causas identificadas. A primeira é o acaso. Azar mesmo. Chamamos de “mutação denovo”. Não havia qualquer erro e ao acaso ele acontece. A maior parte dos cânceres surgem devido a essa causa. O segundo é o erro hereditário, aquele que passa de pais para filhos, na forma de herança genética. Apesar de ser um dos grandes medos dos pacientes, essa é uma causa de câncer bastante incomum. Por último, mas aqui gostaria de chamar a atenção do leitor, temos as causas AMBIENTAIS. Damos o nome de causas ambientais àquelas na qual o ambiente e os hábitos de vida do paciente influenciam direta ou indiretamente no desenvolvimento do câncer. Esses são os fatores de risco que chamamos de MODIFICÁVEIS, pois podemos alterá-los para diminuir a chance de desenvolver a doença. Há inúmeros fatores de risco modificáveis, gostaria de destacar alguns.
Fumar é um dos principais fatores de risco para diversos tipos de câncer, como cânceres do trato digestivo (boca, garganta, esôfago), pulmão, bexiga, entre outros. Consumir bebidas alcoólicas também aumenta as chances de cânceres do trato digestivo. Obesidade e sedentarismo aumentam risco de cânceres de próstata e de mama. Infecções pelo vírus HPV (papiloma vírus humano) causam câncer de colo uterino, genitálias e, pasmem, câncer de boca e garganta. Modificando esses fatores, modificamos o risco de câncer. Parar de fumar e de consumir álcool, fazer atividade física, alimentação saudável e vacinação contra o HPV são alguns exemplos. Vamos explorar cada um desses hábitos saudáveis ao longo do tempo. Grande abraço!
Por Gerson Hiroshi Yoshinari Júnior, CRM/MG 68.721
Médico Radioterapeuta no Grupo Oncominas e professor da Faculdade de Medicina de Itajubá – MG.